Descolonização política do saber.
REFLEXÕES E CRÍTICAS ACERCA DA DESCOLONIZAÇÃO POLÍTICA, ECONÔMICA E CULTURAL DO SABER, SEGUNDO GROSFOGUEL
Nikolas H. Vidal Miranda, Roodji
Mallet, Mayson Glaud, Márcia B. Leal,
Eduardo Paiva, Eugenio Q. Pari, Juan Elias T.
Cayupare
Universidade Federal da Integração Latino-Americana
1 Introdução
Para entender melhor todas as problemáticas que envolvem a colonização e
a estrutura racista que constituem o período da modernidade europeia/euroamericana, que começa após os
processos de “independência” na América. No decorrer do tempo foi colocado em prática esse modelo de dominação e
exploração, que continua subjugando esses povos só que agora com um método
diferente, visando acumulação do capital, a exploração e descriminação.
Esse novo paradigma do imperialismo criou o mito “pós-colonial” que nega as problemáticas de todo
processo histórico contra os povos escravizados. Para desenvolver uma visão
mais crítica acerca do citado, utilizaremos o artigo “Para descolonizar os
estudos de economia política e os estudos pós-coloniais: transmodernidade,
pensamento de fronteira e colonialidade global”, de Ramón Grosfoguel, e a
entrevista “Geopolítica, capitalismo global e o impacto da pandemia da covid-19
no mundo”, de Angela Figueiredo.
O
controle do trabalho no novo padrão de poder mundial constituiu-se, assim
articulando todas as formas históricas de controle do trabalho em torno da
relação capital-trabalho assalariado, e desse modo sob o domínio desta. Mas tal
articulação constitutivamente colonial, pois se baseou, primeiro, na adscrição
de todas as formas de trabalho não remunerado às raças colonizadas,
originalmente índios, negros e de modo mais complexo, os mestiços, na América e
mais tarde às demais raças colonizadas no resto do mundo, oliváceos e amarelos,
e segundo a adscrição de trabalho pago, assalariado, à raça colonizadora, os
brancos. (QUIJANO, 2004, p. 110).
2 A colonialidade do poder eurocêntrico
e sua ideologia
O
artigo “Para descolonizar os estudos de economia política e os estudos
pós-coloniais: Transmodernidade, pensamento de fronteira e colonialidade
global”, traz consigo a necessidade de descolonizar os estudos de economia
política e os estudos pós-coloniais para superar a dominação do pensamento
eurocêntrico e colonial. A descolonização é processo de desconstrução dos
efeitos do colonialismo na política, economia, cultura e sociedade, e a busca
por uma perspectiva não colonial. Tal qual a colonialidade se refere aos
mecanismos de poder e dominação que persistem mesmo após a independência formal
das colônias. Grosfoguel induz que a colonialidade é uma forma de opressão
estrutural que afeta as pessoas de origem não-europeia em todo o mundo. Acerca
da transmodernidade envolvida, ou seja, uma abordagem que se opõe ao modernismo
ocidental e que valoriza a diversidade cultural e o diálogo intercultural, a
apresenta como é uma forma de resistência à colonialidade.
Embora as “administrações coloniais”
tenham sido quase todas erradicadas e grande parte da periferia se tem
organizado politicamente em Estados independentes, os povos não-europeus
continuam a viver sob a rude exploração européia/euroamericana. (GROSFOGUEL,
2008, p. 126).
3 Descolonização da dicotomia
político-econômica e cultural
Nosso
autor argumenta que a transmodernidade, um conceito que transcende as
dicotomias modernas e pós-modernas, pode fornecer uma alternativa
epistemológica que reconhece a diversidade cultural e a pluralidade de saberes.
Ele discute como as abordagens eurocêntricas e ocidentais da economia política
e dos estudos pós-coloniais têm ignorado a diversidade cultural e a história
colonial, perpetuando assim a dominação do pensamento ocidental sobre outras
culturas e saberes. Desenvolve no decorrer que é necessário reconhecer as
diferenças culturais e as relações de poder inerentes a elas para construir uma
perspectiva mais global e inclusiva dos estudos sociais. Além disso, também
apresenta necessário associar medidas políticas, econômicas e culturais a fim
de superar esses desafios.
Como
diz Grosfoguel (2008, p. 116), “Para nós que tomamos o partido da crítica
decolonial, o diálogo com o grupo Latino-Americano de Estudos Subalternos
tornou evidente a necessidade de transcender epistemologicamente, ou seja, a
necessidade de descolonizar”.
4 Pensamento de fronteira e divisão do
trabalho ocidental moderna
Também defende o pensamento de
fronteira, que reconhece as interações culturais entre diferentes grupos, e a
colonialidade global, que enfatiza a continuidade da dominação colonial nas
relações internacionais contemporâneas. No pensamento de fronteira, uma ideia
de que as fronteiras entre as culturas são permeáveis e que o diálogo entre
diferentes perspectivas pode levar a uma compreensão mais ampla do mundo, expõe
como é fundamental para a construção de uma perspectiva não colonial. Junto a
isso, as epistemologias do sul valorizam o conhecimento produzido fora do mundo
ocidental. Assim como a transmodernidade, as epistemologias do sul são uma
forma de resistência a essa colonialidade.
No
mesmo sentido, a divisão do trabalho que foi mantida nas independências é um
antecedente disso. A civilização da modernidade ocidental em que vivemos, onde
os padrões capitalistas, eurocêntricos e neoliberais lançam as bases de uma
civilização planetária que rompe com as diferenças e padroniza o ser e o
habitar o mundo. Essas divisões também devem ser superadas e transformadas a
partir de um pensamento local, de fronteira, que permita uma visão igualitária
do sistema, resgatando de certa forma pensamentos ancestrais.
Estas são formas de resistência que
reinvestem de significados e transformam as formas dominantes de conhecimento
do ponto de vista da racionalidade não-eurocêntrica das subjetividades
subalternas, pensadas a partir de uma epistemologia de fronteira. (GROSFOGUEL,
2008, p. 136).
5 Descolonização do pensamento e do ser
Entendemos que o sistema mundo em
que vivemos é o produto de uma expansão colonial europeia que, apesar de suas
origens há séculos, permanece incorporada em nossas formas de ser e agir no
mundo de hoje. Essa ordem em que nascemos, que, com base na lógica da conquista
e do genocídio, acabou organizando as nações em dominantes e subordinadas, não
só é tida como certa, mas também perpetuada por meio de lógicas que, sob a
frustração de uma Europa que não podia ser, parecem normais e comuns para nós.
A partir daí, normaliza fenômenos
nocivos, como a destruição da natureza, o racismo, o patriarcado e a destruição
do conhecimento e da sabedoria de outras culturas. É justamente para
descolonizar o conhecimento e o ser, em vez de pensar a partir da disciplina,
pensar a partir dos problemas que a humanidade enfrenta, pensar a partir dos
multiversos e reconectar-se a ancestralidade e o conhecimento de nossos povos
nativos, cujas formas de habitar o mundo estão muito distantes dessas lógicas
de morte. A civilização em que estamos vivendo é altamente destrutiva. De modo
que os povos indígenas dos diferentes continentes do mundo são os que sempre
chamam a atenção para o fato de que essa civilização ocidental, que vocês
chamam de moderna e que tanto celebram, é uma civilização da morte e está
destruindo a vida no planeta.
Em
termos históricos, isso permitiu o homem ocidental [...] representar o seu
conhecimento como o único capaz de alcançar uma consciência universal, bem como
dispensar o conhecimento não-ocidental por ser particular e, portanto, incapaz
de alcançar a universalidade. (GROSFOGUEL,
2008, p. 120).
6 Entrevista: Grosfoguel e Figueiredo
Na entrevista, Grosfoguel explica como o
impacto da Covid-19 foi sentido com mais intensidade pela população de mais baixa
renda, logo, teve maior impacto do sul global. Também criticou como a
competição entre empresas farmacêuticas, geradas pelo capitalismo global
incentivou a disputa e diminuiu a cooperação entre estas, o que levou com que a
vacina demorasse muito para ser desenvolvida. Além de impactar a parte mais
populosa da sociedade, a de baixa renda e pobres, a disponibilidade da vacina
também foi prejudicada por isso, de maneira em que houvesse desavença entre a
vacinação entre a classe mais pobre e a classe mais rica da população. E
destaca que o fator que dificultou o acesso a vacina também não foi apenas o
econômico, mas também fatores como idade, raça e gênero.
De
mesmo modo, junto a entrevistadora, elucida como o governo chinês se aproveitou
do momento para adquirir e estatizar as empresas na China. Agora, depois de
anos de crescimento, passava a se apresentar oficialmente como potência
econômica e comercial no mundo. Não sabe explicar se isso é necessariamente bom
ou ruim, uma vez que a China, tal qual os Estados Unidos, utilizam de meios de
dominação e exploração em sua região de influência. Por fim, também nos dá
indícios de como está se estruturando a nova ordem mundial capitalista.
7 Considerações finais
Grosfoguel
não descarta os benefícios do capitalismo, não se demonstrando um
revolucionário nesse sentido. Ele apresenta a complexidade desse sistema e seus
diversos malefícios e problemas que está trazendo para a civilização
(principalmente, ao sul global). Pressupõe a necessidade de um novo olhar
histórico, para superar o historicismo europeu, dado como história global, ao
mesmo tempo que tenta apresentar soluções teóricas para isso.
Educar
politicamente as massas e a partir da sabedoria dos povos ancestrais
(Ameríndios e Africanos) manter uma estética própria, e entender melhor as
especificidades, múltiplas e complexas para só assim poder criar uma teoria
crítica radical. Esse é a alternativa para afastar o pensamento puramente
colonial e pensar fora da bolha que é imposta pela propaganda hegemônica,
desenvolvendo assim uma geopolítica do conhecimento, ultrapassando a
modernidade eurocêntrica aproveitando o melhor dela, e a partir dessa nossa
sabedoria “subalterna” e saber ancestral de forma dialética encontrar caminhos
para superar esse período. A partir do pensamento crítico epistemológico de
fronteira, novas utopias surgirão antagonizados contra o capitalismo selvagem,
reformismo político e reducionismo cultural.
Precisamos nos descolonizar do
racismo epistêmico que eles gerenciam, no qual o conhecimento produzido pelo
sujeito ocidental (imperial e oprimido) na zona do ser é considerado a priori
superior ao conhecimento produzido pelos sujeitos coloniais não ocidentais na
zona do não-ser. O artigo sugere que a descolonização dos estudos de economia
política e dos estudos pós-coloniais é fundamental para promover uma sociedade
mais justa e equitativa. Isso requer uma reavaliação crítica das suposições
eurocêntricas e uma abertura para o diálogo intercultural e a diversidade
epistemológica. Argumenta que a modernidade ocidental é uma construção
histórica que está enraizada na opressão colonial e que a busca pela
descolonização exige uma crítica radical da modernidade ocidental.
Resumindo,
a solução para as desigualdades sociais exige que se imaginem alternativas
decoloniais globais utópicas e que se superem os modos binários de pensamento
em termos de colonialista e nacionalistas, fundamentalistas eurocêntricos e de
terceiro-mundo. (GROSFOGUEL,
2008, p. 143).
FIGUEIREDO, Angela. Geopolítica,
capitalismo global e o impacto da pandemia da Covid-19 no mundo. Novos Olhares Sociais, UFRB, v. 3, n. 1, p. 321-331.
2020.
GROSFOGUEL, Ramón. Para descolonizar os
estudos de economia política e os estudos pós-coloniais: Transmodernidade,
pensamento de fronteira e colonialidade global. Revista Crítica de Ciências Sociais, outubro. 2012. Disponível em: <https://doi.org/10.4000/rccs.697>.
Acesso em: 16 fev. 2023.
QUIJANO, Anibal. El lugar de la naturaleza y la
naturaleza del lugar: ¿globalización o postdesarrollo? in. LANDER,
Edgardo. Colonialidad
del Saber: Eurocentrismo y Ciencias Sociales:
Perspectivas Latinoamericanas. Buenos Aires: CLACSO, 2004.
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