O CONTRATO SEXUAL FEAT CAROLE PATEMAN
A partir da implementação do acordo contratualista pelos teóricos
modernos, várias problemáticas surgem, algumas coisas foram ocultadas de forma
proposital. Uma delas é o contrato sexual, que com a divisão internacional do
trabalho coloca a mulher como não-sujeito, sendo assim inferiorizada e tirada a
possibilidade de intelectualidade em primeiro momento. Com o passar dos séculos
começaram a questionar e lutam por direitos iguais. Mas para isso não basta
dizer que elas devem ter os mesmos “direitos” de forma abstrata, devemos nos
adequar aos novos tempos e reconfigurar a estrutura (Estado) e superestrutura
(Cultura) para só assim todas as mulheres terem os mesmos direitos, sejam eles
quais forem pois o lugar da mulher é onde ela quiser, e sabemos que até hoje na
pratica as coisas não são bem assim.
A cidadania, o trabalho e o casamento
são todas contratuais, mas, como são vistas pela ótica de uma teoria do
contrato extremamente mutilada – de fato, uma teoria que foi literalmente
castrada -, o contrato social e o de trabalho são sistematicamente deturpados e
o de casamento geralmente é ignorado.
(Pateman,1988, p.10)
A história – real ou hipotética – conta
como uma nova forma de sociedade civil e de direito político foi fundada por
meio de um contrato original. A autoridade do Estado, a legislação civil e a
própria legitimidade do governo civil moderno são explicadas como apreensões,
de nossa sociedade, de referências desse contrato.
(Pateman,1998, p.13)
O pacto social do contrato original “forjado” tem a
metade de seus elementos ocultados, o direito político é colocado como direito
paterno, que coloca em prática a dominação dos homens sobre as mulheres. Apenas
Hobbes disse que homens e mulheres são iguais, já os outros teóricos por
cinismo ou falta de visão holística se calaram sobre as questões que envolvem a
cidadania, trabalho, casamento e as relações que são extremamente
contraditórias, visto que manter e ordem saindo do Estado de Natureza para o
Estado Social visava um bem-estar de todos.
A teoria do contrato
social, convencionalmente, é apresentada como uma história sobre a liberdade.
Uma interpretação do contrato original é a de que os homens no estado natural trocarem
as inseguranças dessa liberdade pela liberdade civil e equitativa, salvaguarda
pelo Estado. A liberdade é universal na sociedade civil; todos os adultos
desfrutam da mesma condição civil e podem exercer sua liberdade como se essa
estivesse reproduzindo o contrato original quando participam, por exemplo, do
contrato de trabalho ou de contrato de casamento.
(Pateman,1998, p. 14)
A dominação dos homens sobre as mulheres e o direito masculino de acesso sexual regular a ela estão em questão na formulação do pacto original. O contrato social é uma história de liberdade; o contrato social é uma história de liberdade; o contrato sexual é uma história de sujeição. O contrato sexual cria ambas, a liberdade e a dominação. A liberdade do homem e a sujeição da mulher derivam do contrato original, e o sentido da liberdade civil não pode ser compreendido sem a metade perdida da história, que revela como o direito patriarcal dos homens sobre as mulheres é criado pelo contrato. A liberdade civil não é universal – é um atributo masculino e depende do direito patriarcal.
(Pateman, 1988, p.14)
A sociedade civil é dividida em suas esferas, a esfera
pública da liberdade civil e a outra é a propriedade privada e o contrato
sexual é transformado em contrato matrimonial, que diz respeito a propriedade
privada.
Outra maneira de se ler a
história (como Rousseau a entendeu) é que o contrato social permite que
indivíduos se submetam voluntariamente ao Estado e à legislação civil; a
liberdade transforma-se em obediência e, em troca, recebe-se proteção. Nessa
leitura, os contratos reais da vida cotidiana também refletem o contrato
original, mas agora eles envolvem uma troca de obediência por proteção; eles
criam o que chamarei de dominação e subordinação civis.
(Pateman, 1988, p.21)
Tem-se criticado a
exploração, tanto no sentido marxista técnico de extração de mais-valia como no
sentido mais popular de que os trabalhadores não recebem salários justos por
seu trabalho e enfrentam duras condições de trabalho, bem como no de que as
mulheres não são remuneradas por seu trabalho em casa, ou de que as prostitutas
são ultrajadas e estão sujeitas à violência física (...) Os capitalistas podem
explorar os trabalhadores e os maridos
podem explorar suas esposas, porque trabalhadores e esposas constituem-se
subordinados através dos contratos de trabalho e casamento.
(Pateman,
1988, p. 22)
(Pateman, 1988. p.23)
O nome de Sir Henry Maine
e seu famoso aforismo são mais evocados nas discussões sobre contrato do que
analisados rigorosamente. A discussão de Maine dizia respeito à substituição do
status, no sentido de autoridade paterna absoluta na família patriarcal, por
relações contratuais, bem como a substituição da família pelo individuo como
“unidade” fundamental da sociedade. “status”, no sentido de Maire, abrange um
dos dois sentidos em que esse termo é comumente utilizado hoje.
Às vezes, “status” é
utilizado para se referir mais genericamente a atributo; os seres humanos
ocupam certas posições sociais em função de suas características, tais como
sexo, cor, idade, e assim por diante.
(Pateman, 1988, p.24)
A crítica de John Stuart
Mill em “A sujeição das mulheres” sobre a insuficiência contratual do contrato
de casamento, o qual pressupõe que uma das partes – a esposa – nasce dentro de
uma determinada condição, apoia-se numa contraposição implícita entre contrato
e status nesse sentido amplo.
(Pateman, 1988, p.24)
Geralmente se admite que a esfera privada é o alicerce necessário e
natural da vida civil – isto é, publica -, mas ela é tratada como sendo
irrelevante para os interesses dos teóricos e ativistas políticos.
Desde 1792, pelo menos, quando apareceu a Reivindicação dos direitos da
mulher, de Mary Wollstonecraft, as feministas têm apontado insistentemente para a complexa interdependência das duas
esferas, mas, cerca de dois séculos depois, a sociedade “civil” ainda é comumente
tratada como um domínio que subsiste interdependente
(Pateman, 1988, p.26)
A origem da esfera privada continua sendo, desse modo, um mistério. O mistério aprofunda-se porque as discussões sobre a teoria do contrato social quase sempre passam diretamente do século XVIII para o presente e para as reformulações da história do contrato (social) contemporâneas, feitas por John Rawe. Contudo, Sigmond Freud também (re)escreveu mais de uma versão da história do contrato original. Ele raramente é mencionado, mas talvez exista um bom motivo para a ausência do nome de Freud. Suas histórias explicitam que o poder sobre as mulheres, e não somente a liberdade, está em questão antes do acordo original ser feito, além de deixarem claro que os dois domínios são criados por meio do pacto original. À primeira vista, pode parecer que nos textos clássicos (exceto nos de Hobbes) não há necessidade de se criar a esfera privada, dado que as relações sexuais entre homens e mulheres, o casamento e a família já existiam no estado natural. Mas o contrato original da origem a “sociedade civil”, e a história do contrato sexual deve ser contada a fim de se esclarecer como o domínio privado é estabelecido e por que a separação da esfera pública é necessária.
(Pateman, 1988, p.26 e 27)
Nas últimas décadas o embate entre os socialistas e liberais,
torna-se cada vez mais complexo e perigoso, pois os donos do poder não querem
perder seus benefícios que a escravidão assalariada e o oligopólio podem
oferecer a essas pessoas desprezíveis que são a burguesia, que inclusive não
tem nacionalidade, mas sim buscam o lucro e progresso acima da Ética. O socialismo
de mercado vem a cada dia ganhando mais destaque no cenário mundial é hoje é a
única solução para vencer o capital em seu próprio jogo.
Com as feministas e intelectuais na linha de frente da
revolução grandes avanços estão por vir, desmascarando toda a perversidade que
é colocado desde o primeiro momento na divisão internacional do trabalho e o
contrato de casamento, todas essas obras ainda são recentes e precisam ser
espalhadas.
Um contrato civil de escravidão não difere muito de qualquer outro contrato.
O fato de a liberdade individual, mediada por contrato, pode ser exemplificada
pela escravidão, deveria fazer os socialistas e as feministas hesitarem em
utilizar as ideias do contrato e do individuo como propriedade.
(Pateman,
1988, p.30 e 31)
Os bem-conhecidos argumentos contra o contrato, seja os da esquerda ou os de Hegel, o maior teórico crítico do contrato, são todos colocados sob uma luz diferente assim que a história do contrato sexual é restabelecida. Ironicamente, os críticos também operam dentro dos parâmetros fixados pelo contrato original patriarcal e, portanto, suas críticas são sempre parciais. Por exemplo, a sujeição matrimonial ou é referendada, ou é ignorada, nunca se avaliando a interpretação patriarcal do “trabalhador” e nunca se apreendendo as implicações do contrato civil de escravidão
(Pateman, 1988, p.31)
Os influentes estudos de Michel Focaut podem sugerir que a história do
contrato sexual produza uma abordagem do poder e da dominação que permanece
presa a uma antiga formulação jurídica, “centrada unicamente na afirmação da
lei e da ação dos interditos”. Seguramente a legislação e o contrato, bem como
a obediência e o contrato, andam juntos, mas disso não se deduz que o contrato se
refere apenas a legislação, nem, nos termos de Focaut, à disciplina, à normalização
e ao controle. Na História da Sexualidade, Focaut observa que, “desde o século
XXVIII, [novos mecanismos de poder] tomaram conta da existência dos homens, dos
homens como corpos vivos “. Mas desde o século XXVII, quando as histórias do
contrato original foram contadas pela primeira vez, um novo mecanismo de
subordinação e disciplina permitiu que os homens tomassem conta do corpo e da
vida das mulheres.
O contrato original (diz-se) criou uma forma de legislação, a
participação nos contratos reais da vida cotidiana constitui uma forma moderna
de estabelecimento de relações localizadas de poder dentro do campo da
sexualidade, do casamento e do trabalho. A legislação e o estado civil, bem
como a disciplina (patriarcal), não são duas formas de poder, mas dimensões da estrutura
complexa e multifacetada de dominação do patriarcado moderno.
Contar a história do contrato sexual é mostrar como a diferença sexual,
o que é ser “homem” ou “mulher”, e a construção da diferença sexual como
diferença política são essenciais para a sociedade civil.
(Pateman, 1988, p.32)
O feminismo expõe essa questão da diferença sexual,
quando é colocado que essa diferença é simplesmente natural e de ordem da
natureza. Pois então que as leis sejam revistas e alteradas de acordo com as
necessidades urgentes para uma equidade entre os sexos com todas as leis e políticas
sendo aplicadas com “gênero neutro”.
O patriarcado é entendido, então, como um problema privado e familiar que pode ser resolvido se as leis e políticas públicas tratarem as mulheres como sendo exatamente iguais aos homens. Entretanto, o patriarcado moderno não é relativo, primordialmente, à sujeição familiar da mulher. As mulheres têm relações sexuais com os homens e são esposas antes de se tornarem mães de família. A história do contrato sexual é sobre relações (hetero) sexuais e sobre mulheres personificadas como seres sexuais. A história nos ajuda a compreender os mecanismos através dos quais os homens reivindicam os direitos de acesso sexual e de domínio dos corpos das mulheres.
(Pateman, 1988, p.33)
Enfatizar como o significado de “homem” e “mulher” contribui para a estruturação
das mais importantes instituições sociais não é recorrer a categorias puramente
naturais. Nem é negar a existência de muitas diferenças importantes entre as
mulheres, e que, por exemplo, a vida de uma jovem aborígene no centro de Sidney
é muito diferente da vida de uma esposa de rico banqueiro em Princeton.
(Patemanm 1988, p.34)
BIBLIOGRAFIA:
PATEMAN, Carole. O Contrato Sexual. Ed
Paz e Terra. Rio de Janeiro, RJ, 2023
Comentários
Postar um comentário